A equipe econômica do governo já começou a se preparar para o próximo desafio no Congresso Nacional: a mudança no sistema tributário, avaliado como complexo e considerado por especialistas um entrave aos investimentos e ao crescimento da economia.
Segundo proposta em elaboração no governo, a primeira mudança seria acabar com a tributação sobre a folha salarial, ou seja, os 20% cobrados de patrões e empregados por meio da contribuição previdenciária. Em seu lugar, a intenção é criar uma contribuição eletrônica sobre pagamentos, com o objetivo de estimular o emprego em um momento no qual a taxa de desemprego cresceu para 12,4%, atingindo 13,1 milhões de pessoas no trimestre encerrado em fevereiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No entanto, o projeto, coordenado pelo secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, enfrentará a concorrência de outra proposta. De acordo com informações do blog da Andréia Sadi, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pretende dar prioridade a outra proposta de reforma tributária, costurada pelo economista Bernardo Appy em conjunto com outra do ex-deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-SP), que foi relator da reforma tributária na legislatura passada.
Segundo informação de interlocutores da área econômica, o tributo sobre pagamentos, foco de estudo no governo, incidiria também sobre movimentações financeiras – como acontecia com a Contribuição Provisória Sobre Movimentação Financeira (CPMF) – mas teria uma base ainda mais ampla.
Na proposta, a tributação se daria na entrada e na saída do dinheiro da conta, incidindo, portanto, sobre todos débitos e créditos. Incidiria ainda sobre trocas de produtos (uma troca de veículos, por exemplo, só poderia ser oficializada com o recolhimento do tributo), quitação de dívidas e operações de câmbio, por exemplo. Com isso, abrangeria qualquer fluxo de pagamentos.
“A reforma tributária no Brasil deve seguir nessa direção, começando pela substituição de tributos que pesam sobre a folha de salários. O país onera fortemente o fator trabalho, e a troca dos 20% de contribuição previdenciária por uma contribuição eletrônica de 0,6% sobre os pagamentos é uma forma de dar início à adequação da estrutura tributária nacional à economia digital e promover a necessária desoneração do custo trabalhista”, escreveu o secretário da Receita em seu blog.
A área técnica da equipe econômica já admitiu que esse seria um tributo em “cascata”, ou seja, que incidiria todas as cadeias da produção. Esse espécie de tributo sofre rejeição por parte do setor produtivo. No entanto, a avaliação, com base em simulações, é de que a carga tributária cairia para 170 setores da economia, pelo fato de a alíquota ser baixa (de 0,6%, 0,7%).
Por meio de propaganda presidencial, o presidente Jair Bolsonaro já refutou a possível criação de um tributo nos moldes da CPMF (incidente nos pagamentos e recebimentos nos bancos). Esse tema, inclusive, gerou tensão na campanha e apreensão no mercado.
Tributação sobre a folha
Segundo dados da Receita Federal, a arrecadação sobre a folha de salários, em 2017, somou R$ 555 bilhões, o equivalente a 38% de tudo o que foi arrecadado pela União naquele ano, em impostos e contribuições federais (total somou R$ 1,44 trilhão).
Tal valor representou 8,47% do PIB – e ficou acima de Estados Unidos e Reino Unido em 2016, mas abaixo de Itália, Alemanha e França (veja abaixo):
Devido o fato do governo não pode abrir mão de arrecadação, em um momento de crise fiscal – em 2018, as contas públicas registraram um rombo pelo quinto ano seguido, no valor de R$ 120 bilhões – a intenção da equipe econômica é fazer uma substituição gradual, iniciando com uma alíquota menor sobre pagamentos (0,2%, ou 0,3%) e ir reduzindo, com o passar do tempo, a contribuição previdenciária – para 15%, depois 8%, até substituir completamente uma base de tributação pela outra.
Taxar a informalidade
Por meio de uma rede social, Cintra informou que a ideia é “fazer a economia informal pagar impostos”, o que poderia, na visão dele, aumentar a base tributária (volume de recursos sobre os quais incidiriam impostos) em mais de 30%.
“Assim, quem paga impostos demais hoje, vai poder pagar menos”, afirmou. Ele também avalia que, no Brasil, “quem paga imposto paga demais; e uma camada de privilegiados paga pouco ou nada”.
Ainda segundo o secretário, para baixar impostos dos assalariados, que são muito tributados, é preciso “simplificar e fazer todos pagarem, inclusive os informais e sonegadores”. “Se todos pagarem, todos pagarão menos”, declarou.
Segundo avaliação da área econômica do governo, a tributação sobre pagamentos obedece a uma tendência mundial, pois incide sobre uma base de tributação (fluxos financeiros) que tem uma dificuldade muito maior de sonegação por parte dos contribuintes.
Ainda segundo a análise, esse formato, estaria sendo estudado por países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) para evitar perdas de arrecadação nas compras que as pessoas fazem de produtos pela internet, como aplicativos e jogos eletrônicos. Seria uma forma de tributar os recebimentos das grandes empresas multinacionais do setor, que têm sede em outros países.
Fonte: G1