O Supremo Tribunal Federal começou a discutir, nesta quarta-feira (11/12), se é crime não recolher ICMS declarado. O plenário discute se o Direito Penal pode alcançar a inadimplência e considerar crime de apropriação indébita a dívida fiscal de um empresário que reconhece ter um débito, mas não o quitou.

 

O julgamento foi suspenso em razão do intervalo regimental. Inaugurando as sustentações orais, o tributarista que atua na representação dos comerciantes, Igor Mauler Santiago, do escritório Mauler Advogados, afirmou que já existe uma punição rigorosa fora do direito penal para quem declara tributo e não paga: as multas elevadas, juros de mora e protesto em cartório.

 

“A simples inadimplência não pode ser considerada crime. A lei não prevê essa conduta como crime. De fato, o artigo 2º, inciso II, da Lei 8.137/90 fala em ‘deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo descontado ou cobrado’. Tais termos, dada a segurança jurídica máxima que orienta o Direito Penal, devem ser tomados na acepção técnica que têm no ramo de origem, o Direito Tributário”, disse.

 

O número de pessoas que podem ser atingidas pela criminalização dessa conduta em Santa Catarina e São Paulo pode superar 200 mil, segundo afirmou o defensor público Thiago Campos, de Santa Catarina.

 

Segundo o defensor, se houver a tipificação de crime, o número de pessoas enquadradas no entendimento vai superar 200 mil só nos estados de São Paulo e Santa Catarina. “A criminalização da conduta viola o artigo 186 do CTN porque deturpa a ordem de preferência de créditos. A partir da criminalização, o crédito tributário de ICMS preferirá a todos, inclusive ao crédito trabalhista.”

 

Política Fiscal

 

O MP-SC defendeu que é crime o não recolhimento do ICMS, ainda que declarado. O MP entende que o dinheiro relativo ao imposto pertence ao estado e, ao deixar de pagar a dívida, os empresários estariam se apropriando de recursos alheios.

 

O advogado criminalista Pierpaolo Bottini, em nome da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), afirmou que mais do que uma questão técnica, o que está em jogo é a legitimidade de usar o direito penal como instrumento de política fiscal.

 

“A Constituição prevê que não haverá prisão por dívida, exceto em caso de alimentos. Aquele que reconhece a inadimplência fiscal não sonega, não frauda, não esconde. Apenas deixa de pagar, é devedor do estado. Não se trata de conduta louvável. É um ato reprovável, com consequências sociais e econômicas e tal comerciante deve ser objeto de execução fiscal. Mas não há crime, segundo a própria Constituição”, defendeu.

 

Crime Reconhecido

 

No caso, a corte vai analisar um pedido de Habeas Corpus impetrado pelos comerciantes Robson Shumacher e Vanderléia Shumacher, proprietários de uma loja de produtos infantis em Santa Catarina.

 

Em agosto de 2018, por seis votos a três, os ministros da 3ª Seção do STJ negaram Habeas Corpus de empresários que não pagaram valores declarados do tributo, depois de repassá-los aos clientes. Ao seguir o voto do relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, a prática foi considerada apropriação indébita tributária, com pena de 6 meses a 2 anos, além de multa.

 

Até aquele momento, havia divergência entre as turmas da corte. Se, por um lado, os ministros da 5ª Turma consideravam o ato crime, por outro, os da 6ª decidiam em sentido oposto. Agora no STF, o caso está sob relatoria de Barroso.

 

O HC foi proposto ao STJ pela Defensoria Pública de Santa Catarina depois de o Tribunal de Justiça do estado afastar sentença com absolvição sumária. No caso, o Fisco constatou que os denunciados apresentaram as declarações fiscais devidas, mas, em alguns meses de 2008, 2009 e 2010, não recolheram os valores apurados aos cofres públicos. O montante foi inscrito em dívida ativa e não foi pago nem parcelado.

 

O ICMS é um tributo de competência estadual. Na prática, esse imposto é cobrado de forma indireta, ou seja, o encargo econômico é suportado por pessoa diversa daquela que pratica a conduta típica. No caso do ICMS calculado sobre as operações próprias da empresa, o valor do imposto é adicionado ao preço do produto comercializado ou do serviço prestado.

 

De acordo com o Código Tributário Nacional, quando o contribuinte deixa de repassar aos cofres públicos os valores de ICMS, comete um mero inadimplemento de sua obrigação tributária. O próprio STJ já decidiu, em sede de recurso repetitivo, que o mero inadimplemento de tributo não é infração à lei. O entendimento foi fixado no REsp 1.101.728.

 

Fonte: ConJur

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